quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Key


Sentia seu olhar quente em minha nuca, mas não me manifestava. Às vezes suas mãos tocavam com mais força minhas coxas, e percebia que por mais que me esquivasse acabaria me rendendo à seus carinhos. O gosto limpo de seus lábios me tentava a provar o resto de seu corpo. Eu resistia bravamente, assim como o guerreiro do jogo de PS2 que havia acabado naquela semana.
Toda aquela comida e eu só conseguia pensar em qual seria o gosto de seu tórax. Se seu colo era tão suave quanto o toque de seus longos dedos. Seu olhar apimentado despertava ainda mais meu apetite, e eu descontava na cevada toda minha covardia.
Mais uma vez Morfeu me envolveria, mas não deixaria nenhum anjo me tocar.

― Encare o demônio nos olhos! Pensava.
Não adiantava, sentia seu hálito em meu pescoço e suas mãos sobre minhas costas em um leve movimento de sobe e desce. Covarde! Covarde! Se pudesse teria aberto as janelas e me atirado, mas fazia frio e eu trajava um vestido azul da cor de seus olhos. Talvez um pouco mais escuro, mas ainda assim eram da cor de seus olhos.
Envolta em seus braços adormeci. Dormi um sono leve. Ele pareia uma rocha. O barulho do silêncio me atormentava. A luz não deixava descansar meus olhos. Na verdade não me lembro de nenhuma vez que tenha dormido plenamente a seu lado. Enquanto ele dormia tentava decorar os mistérios de seu corpo. Cada movimento. Suas marcas. O compasso de seu coração. A respiração hora forte hora fraca. Quantas vezes se virava e a posição que mais gostava. Em uma cama apertada dormíamos como se fossemos um. E eu não reclamava. Tentava me aconchegar cada vez mais em seu corpo na inútil tentativa de descobrir o que se passava em sua alma.
Na manhã seguinte acordei com um gosto estranho na boca. Ah, se eu soubesse o quanto a covardia era amarga teria escancarado o vidro e me atirado sem me importar com o quanto ventava. Nem a pasta de tuti-fruti conseguiu arrancar de meus lábios o sabor da derrota para aquele falso-puritanismo. Os olhos borrados de rímel anunciavam o início de mais uma manhã. Outro dia havia começado. Eu tinha ganhado a batalha, mas a guerra não havia terminado. Os obstáculos ficavam mais difíceis. Não tinha mais forças, ainda assim resistia a suas carícias. Seus afagos pareciam me acender cada vez mais, e eu nem olhava em seus olhos com medo de ser hipnotizada e me render a seu sexo. Então rezava. E pedia para que o arcanjo não virasse Lúcifer. Para que não cedesse às suas tentações. Embora quisesse, não podia. Então coloquei um cinto na alma e joguei a chave pelo oitavo andar em direção ao mar. E até hoje ele mergulha tentando encontrar a parte de mim que não pode ter.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

SOMENTE PARA QUEM TEM CORAGEM DE SE IDENTIFICAR... O MUNDO É CHEIO DE COVARDES!