segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Casinha de sapê.

Resolveu se isolar do mundo para não ter mais que assistir as coisas que não a deixavam dormir. Construiu uma casinha no morro mais alto da cidade. De lá podia ver as pessoas se jogando em busca da felicidade. Avistava também toda aquela imensidão sem brilho. Mas ainda assim achava um azul bonito. À noite o azul se transformava em preto, e ela se agitava com a falta dele. Todo aquele espaço e ele lá sozinho. Não entendia como não sentia a solidão bater naqueles imensos portões. Fingia não escutar acreditava ela. Ele havia voltado para a cidade das pedras. Ela tinha construído sua masmorra com elas, e de lá jogava suas tranças com a esperança de um dia ele agarrá-las e escalar a seu encontro. Não podia partir. Longe do mar se sentia seca. Ele deixava seu coração endurecer como granito. Um granito branco. Ele se vestia de branco. E ela insistia no verde. Só para dar esperanças as lembranças. Ele não gostava. Ainda assim ela usava. Ele cuidava do que ela tinha de mais bonito. Ela do que ele mais prezava. Não entendia como podia gostar tanto delas e não dar a mínima para ela. Em suas veias via correr o verde. E ele as tirava da carteira com muita relutância. Sentia sua alma se desmanchar como dunas. Hora pequena. Hora gigante. Mas ao se olhar no espelho ainda se via com um metro e sessenta. E mais uma vez Alice se fazia presente. Tudo o que queria era o Coelho Branco atrás dela. A seu lado. Sem o relógio. Pois, fora esse estúpido objeto de contar segundos que os havia afastado. Ele a algemara. Ela sentia seus pulsos livres. As correntes estavam no meio dos seios, onde ele gostava de aconchegar a cabeça e adormecer como criança. Por diversas vezes pensou que ele acordaria ao ouvir as batidas descompassadas e os gritos de socorro vindo de seu coração. Mas ele dormia como pedra. Encostava a mão em seu tórax livre de pelos e nada sentia. O tato não era seu forte, e sim o olfato. Podia sentir seu cheiro em meio às rochas. Principalmente quando se movimentava por elas a noite. O odor do mar já não lhe era familiar. Apesar de avistá-lo da pequena janela. Só cheirava o pó que o calhau levantava quando ele se movia. Procurava respirar lentamente para que ele não acordasse daquele sonho azul e fosse embora. Ao mesmo tempo em que se sentia protegida tinha muito medo. Medo das badaladas do relógio, medo do telefone tocar, medo do amanhã. Não do alvorecer, mas do amanhã sem ele. Sem suas broncas. Sem seu brilho. Sem seu sorriso. Sem sua presença. Tudo ficava negro. As esmeraldas viravam turmalinas cinza. Sua mão gelava e seu coração adoecia. Sabia qual era a cura, mas não a possuía. Quem sabe, um dia o verde não se lhe agradasse somente no bolso. Mas também no coração.

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